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Ensaio poético sobre os três fans do cego


James Ensor, Death and the masks, 1897



Fanatismo não tem idade

Fanatismo não vê fronteira

Fanatismo não tem bandeira

Atado aos atavismos do ego

Deixa todos sem eira nem beira


Fantasma não tem cidade

Fantasma não tem caveira

Fantasma das trevas não dá bobeira

Saído, bêbado, debaixo da lápide

Te deixa rápido com as mãos nas cadeiras


Fantasia não tem piedade

Fantasia de um pé de rameira

Fantasia que só engana a blogueira

Se eu soubesse que tu não era toda essa fogueira

Eu me vestia de pura padroeira


Já que nesse turbilhão de fans

Cada qual veste a sua máscara macumbeira

Na volúpia de parecer bem na foto baladeira

Já que, em realidade, estão aos pedaços descendo a ladeira

Seria melhor se baixassem um aplicativo que passasse a alma na peneira

Ao invés de se exaurirem, fanáticos, atrás de tanta asneira

Em viciada brincadeira

Sob a sombra da palmeira

Arrastando a inconsciência lameira


Nessa fantasia derradeira

Já perdi quase toda a franqueza

Enquanto o fanático maloqueiro

Tresloucado na sua branca pobreza

Amarra-se à treva que defende

O fanático trambiqueiro


Nenhum deles é flor que se cheire

Se travestem, eufóricos

De salvadores da pátria mamada brasileira

Com as cores puras da bandeira

Da cara de pau pintada

Ou do vermelhim

Do pau brasil da secular roubalheira

Todos tensos e atordoados

Sem senso e amontoados

Com as marcas do navios negreiros

Todos perdidos, ensimesmados

Em sua marcha-estradeira

Que sem rumo e sem governo perfeito

Sem partido ou prefeito

Se perdem todos no caos da ribeira

Sem perdoarem o seu próprio sujeito

E para aliviar a sua própria tristeza

Tentam esganar o outro de jeito

Quanta perca de tempo

Ficar se digladiando

Por tanta bobageira

É tanta perca que até me perdo

Por entre consoantes dissonantes

E entre verves dissimulantes


Eu, agora, quero mesmo é ser livro

Para numa noite silenciosa

Te ensinar a ser livre

Sem fantasma

Sem fantasia

Sem fanatismo

Apenas paralirismo

Pra não te deixar cair no teu próprio abismo


Eu, hoje, quero mesmo é ser árvore

Para numa dessas primaveras

Te ensinar como se arvora

Sem impressionismo

Sem ilusionismo

Sem idolatria

Pra não te deixar cair do galho da tua própria egolatria


Copyright Flavio Graff


Pintura de Paula Rego


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